1990 – A última grande década dos Camisas 10 no futebol brasileiro
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A tal da camisa 10 alimenta os mais puros sonhos de futebol. Invade o terreno da propaganda, recebe diversos tributos nas artes e toma emprestada do dicionário palavras como “qualidade”, “categoria” e “virtuosismo”. O número 10 está mistificado na cultura futebolística graças a um ainda jovem Pelé, que ganharia o mundo em 1958 e se transformaria em Rei. Nas décadas seguintes, estampavam, em geral, o uniforme dos maiores craques de cada time, e não eram poucos.
No Brasil, mais precisamente no futebol brasileiro, a década de 1990 registra a última grande leva e reunião da excelência na camisa 10.
Como surgiu a mística da Camisa 10?
A mística se inicia na Copa do Mundo de 1958, disputada na Suécia. A camisa 10 da seleção brasileira caiu sobre os ombros de um menino de 17 anos, que se chamava Edson, mas era conhecido como “Pelé”.
Os torcedores brasileiros nunca haviam comemorado um título mundial e sentiam calafrios só de pensar no “Maracanazzo”, de 1950, quando a seleção brasileira foi derrotada em pleno Maracanã para o Uruguai.
Porém, o enredo agora seria diferente. E em 1958, aquele ainda adolescente, que atuava no Santos Futebol Clube, com a 10 do Brasil nas costas, colecionou majestosas atuações, em um papel de protagonismo no crucial e tão aguardado título da seleção brasileira em uma Copa do Mundo. E foi ali que ele se coroou rei: o “Rei Pelé”, com a 10 nas costas.
Após a conquista, o número virou um símbolo nacional, além de uma referência para outros países e para os torcedores.
O Legado de Pelé:
A 10 brilha em outros craques nas décadas seguintes
Antes mesmo de 1958, a 10 brilhava imponente em nomes como Dida, no Flamengo, e Zizinho, no São Paulo FC. As numerações, contudo, não guardavam um significado relevante. A conquista na Suécia abriu alas a uma enorme fartura de talentos do futebol brasileiro. O melhor jogador de cada clube, na maioria das vezes, deveria atuar com a 10.
No Brasil, a década de 1970 espalhou a magia dos camisas 10 pelos gramados. Pegando carona no sucesso de Pelé, tivemos: Roberto Rivelino (Corinthians e Fluminense), Ademir da Guia (Palmeiras), Dirceu Lopes (Cruzeiro), Pedro Rocha (São Paulo), entre tantos outros.
Zico, o camisa 10 da Gávea, começou a se destacar ainda na década de 1970, mas marcou a sua história no futebol principalmente nos anos 1980. Assim como seu rival Roberto Dinamite, do Vasco. No Brasil, o camisa 10 brotava que nem mato. Era a magia do futebol brasileiro em campo.
Anos 1990: A última encantada leva de Camisas 10 no Brasil!
Se a década de 1990 se notabilizou pelas cartolagens desprezíveis, que rebaixavam a cada ano o futebol brasileiro, por outro lado, o nível técnico elevado dentro das quatro linhas ainda resistia. E assim como nas décadas anteriores, havia um festival de bons camisas 10 pelo país. Abaixo separamos a nossa lista com grandes camisas 10 dos anos 1990, ainda os dividindo em clássicas formas de atuar.
Os maestros canhoto
. Já no ano de 1990, Neto liderou o Sport Clube Corinthians em sua primeira conquista de Campeonato Brasileiro. O hoje apresentador se destacou por uma visão de jogo apurada, além de enorme habilidade ao bater na bola. É unânime em qualquer lista de melhores cobradores de faltas da época.
. Lateral de origem, Leonardo se tornou meia devido aos atributos que possuía, como bons passes e rápida chegada ao ataque. Após passagem pelo Valência, assumiu a 10 do Tricolor com a saída do ídolo Raí e, rapidamente, deu conta do recado. Obteve destaque no Mundial Interclubes de 1993, contra um fabuloso AC Milan.
. Djalminha tinha uma habilidade fora do comum. Acertava dribles desconcertantes, passes mágicos e possuía um controle de bola fenomenal. Exímio cobrador de pênaltis, usava a cavadinha com eficiência. Após despontar no CR Flamengo e atuar bem pelo Guarani, brilhou no inesquecível Palmeiras do primeiro semestre de 1996. Faturaria a Bola de Ouro do Campeonato Brasileiro daquele mesmo ano.
. Alex efetuava assistências como poucos. Tendo grande poder de arremate, era um artilheiro mesmo sendo um clássico meia. O bom início no Coritiba o levou ao Palmeiras, onde daria um toque especial na vencedora equipe comandada por Luiz Felipe Scolari. Já nos anos 2000 ainda arrebentaria no Cruzeiro ao conquistar a Tríplice Coroa. Na Europa se destacou no Fenerbahçe, da Turquia.
O destro habilidoso
. Raí combinava classe, força e eficiência no multivencedor São Paulo de Telê Santana. Protagonista absoluto em campo e extremamente decisivo nos títulos tricolores, ele superou a sombra do irmão Sócrates para também se tornar uma figura histórica do futebol nacional.
. Giovanni usufruía de uma técnica refinada. Do alto do seu 1,90m, enxergava o jogo em olhos de lince e personificava a máxima do “jogar de terno”. Ganhou da torcida do Santos Futebol Clube o apelido de Messias e recebeu a Bola de Ouro do Campeonato Brasileiro 1995. Em 1996, foi o artilheiro do Campeonato Paulista com 24 gols.
. Um dos destaques do São Paulo de Telê, Palhinha mesclou técnica e experiência no Cruzeiro campeão da Copa do Brasil 1996 e da Taça Libertadores da América em 1997. Até hoje, os torcedores celestes relembram seus passes e jogadas decisivas.
. Vindo do Real Madrid e sem grande expectativa, o sérvio Dejan Petkovic desembarcou no Vitória em 1997. Entrou na galeria dos grandes ídolos do clube baiano ao anotar 59 gols em 90 partidas. Era mestre nas bolas paradas e também se destacava pela visão de jogo. Nos anos 2000, conquistaria o carinho eterno da torcida do CR Flamengo.
Rápidos e Mortais
. Dener driblava um, dois, três, ou até mais adversários se fosse preciso. O público frequentava o estádio para vê-lo driblar, e valia o preço do ingresso. Um acidente de carro, no Rio de Janeiro, em 1994, tirou sua vida quando atuava pelo Vasco da Gama. Mas ele brilhou mesmo na Portuguesa, onde muitos recordam até hoje seus dribles e gols antológicos. Ainda teve uma breve passagem pelo Grêmio.
. Um jovem Amoroso demostrou maturidade de veterano no ótimo Guarani de 1994. Fez barba e cabelo no Campeonato Brasileiro daquele ano, levando a Bola de Ouro do torneio, prêmio entregue pela Revista Placar, além da artilharia com 19 gols, ao lado de Túlio Maravilha. Tinha inteligência, habilidade e instinto goleador.
. Sávio marcou uma geração de flamenguistas por meio de dribles, gols, rapidez e boa capacidade de servir os companheiros. Fez uma memorável dupla com Romário e virou o “Anjo Loiro da Gávea”. Saiu do Brasil para também fazer história no Real Madrid.
. Edilson, o “Capetinha”, infernizava os adversários com um estilo provocativo, irreverente e driblador. Ninguém gostava de enfrentá-lo. Fez sucesso no espetacular Palmeiras de 1993/1994 e foi um dos protagonistas do poderoso Corinthians do final da década. Em ambos os históricos times usou a camisa 10.
. Se Edmundo é um símbolo da camisa 7 no Palmeiras, no Vasco da Gama ele também eternizou a camisa 10. Com um futebol avassalador, foi o grande jogador do Brasil no ano de 1997, quando levou o clube a conquista do Campeonato Brasileiro. Teve um campanha fantásticas, já que anotou 29 gols em 28 jogos, além de muitos dribles e passes precisos.
. Um jovem Ronaldinho surgia no Grêmio e logo vestiria a clássica 10. Abusava de canetas, chapéus, elásticos, desferia lindos passes, dominava a bola com uma facilidade assombrosa e fazia seus gols. O público testemunhava, dessa forma, o surgimento de um ícone do futebol mundial.
Anos 90: A última era dourada da 10 no Brasil
O futebol doméstico registra a presença de ótimos jogadores vestindo a 10 no período pós-90. Nesse recorte, os anos 2000 levam uma clara vantagem quantitativa sobre a década passada, aproveitando alguns destaques com a marca 90’s. Nomes como o repatriado Juninho Paulista (Vasco da Gama), cujo brilho se intensificara na Europa, e o argentino Carlos Tevez (Corinthians), também dariam brilho para um futebol que perdia um pouco de sua magia.
A história indica que a última grande reunião de virtuosos camisas 10 no país ocorreu mesmo nos tempos noventistas. Outros bons jogadores vestiram a 10 em seus clubes brasileiros nos anos 90. A depender do critério utilizado, a lista que reproduzimos poderia aumentar ainda mais.
As razões da extinção do Camisa 10 no Brasil
A Lei Bosman, datada de 1995, libertou os futebolistas das garras dos clubes e também promoveu uma maior abertura do mercado europeu. Na prática, o limite de estrangeiros por equipe caía no Velho Continente, enquanto o apetite por talentos sul-americanos aumentava.
Com a incompetência da cartolagem e as desvantagens da economia brasileira, a dificuldade de segurar jogadores, inclusive os camisas 10, equivale à tarefa de subir o Everest de bicicleta.
Antes da lei, as exportações do futebol tupiniquim se baseavam, de uma maneira geral, nos melhores dos melhores. Depois de 1995, em contrapartida, o cenário é de feira, e outros mercados engoliram o mercado brasileiro.
As mudanças mercadológicas na Europa ainda se traduziam em novidade na segunda metade dos anos 90. Assim, o nível dentro das quatro linhas continuava elevado no Brasil, apesar das transferências já crescentes. Os impactos levariam certo tempo para aparecer.
Obs: o foco do texto são jogadores fardando a 10 em solo nacional, independente de posição e características.